terça-feira, 18 de maio de 2010

Alfaiate

Por muito que possa apreciar os benefícios da mecanização e reconhecer o salto qualitativo resultante da Industrialização... o produto que sai isolado das mãos de um artífice será sempre para mim valorizado. É verdade que não será perfeito como uma maquina, e por ventura será mais caro por não ser feito por mãos em série... mas existe o que possa ser considerado uma certa veleidade de snobismo, de possuir e envergar o trabalho de outrem feito só para nós. Falta acrescentar que naturalmente eu terei de fazer o meu trabalho para poder pagar o dele. Portanto... é com certeza um snobismo controlado pelo meu mérito, ou falta dele. Claro está que nem sempre é possível recorrer a esse artifice para nos produzir as roupas. Ou por falta de escolha, ou por falta de tempo... ou por falta de mérito (meu) para pagar o mérito (dele). Ainda assim estou certo que com algum tempo e pesquisa, certamente que se encontram boas opções no mercado.


Até lá, pois com o pouco tempo disponível tenta-se recorrer ao que o prêt-à-porte nos pode oferecer de mais parecido. Por vezes arrisco o limite do que o meu mérito pode me oferecer para um quasi-manual, onde ainda fazem um ajuste a pessoa. Não gosto de plasticidades, e coisas forjadas. São peças lindas, feitas com qualidade e arte, e que posso vestir com gosto...

O que não precisavam era de vir com o raio daquele tresponto só para iludir a imaginação do cliente a dar laivos de personalização... e que depois me demorou trinta minutos a tirar e deixou vários furos no tecido!

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Death

Em inglês, pois é essa a língua do mundo virtual. Esse mundo que nos deu uma nova dimensão. Abrimos a janela virtual, ou devo dizer a window(s), e lançamos a nossa vida para um novo mundo, desta feita não de oceanos de água, mas de bits e bites que nos dão uma infinidade de novas costas para avistar. Tantas quantas as pessoas, e essas são aos biliões. Depois das pessoas há ainda as consciências colectivas, as comunidades e mesmo os sistemas que por vezes interagimos sem perceber que na realidade não estamos a comunicar com ninguém. Ou melhor... estamos sim, mas é um "alguém" feito de software que interage connosco, uma espécie de consciência individual ainda limitada no raciocínio. Não é necessário ser fã de ficção cientifica para perceber que, ao ritmo alucinante do progresso da computação, em breve estas entidades ganharão vida própria...

Esta descorporização das consciências abre caminho para uma transmutação da vida para o mundo etéreo da virtualidade. Mais uma vez... nada disto é novidade. Muitas foram as visões já adiantadas sobre a modernidade feita na virtualidade. Arrisco contudo que o foco usualmente é sobre a emergência das máquinas, ou dos softwares, esse "alguém" que não existe ainda mas que se anuncia que "vem aí". É com certeza mais fácil de conceptualizar do que a transmutação para a virtualidade... da vida humana. O problema da Alma, da Consciência, o Intelecto humano. Hoje não nos restringimos apenas a ser o que sentimos palpável nas mãos. Ao mesmo tempo que abrimos a window(s) para vermos esse novo mundo, levamos connosco para lá parte, ou até grande parte, do que é a nossa vida. Vivemos com toda a nossa informação registada on-line, mas vivemos também com os nossos blogs, com os nossos emails, as nossas redes sociais, os nossos amigos (virtuais e bem reais), tudo isso... os amigos, os pensamentos, as reflexões, as paixões, os hobbies e os amores estão hoje reflectidos, mas também a viver ali! A tal nova dimensão virtual da vida permite-nos transcender para alem dos limites do físico, somos também virtuais... na vida, e na morte!

Morremos virtualmente tantas vezes quantas quisermos. Com mais ou menos trabalho, podemos ressuscitar para uma nova vida, ou tentar continuar a anterior... mas e quando morremos na realidade? O que acontece à virtualidade?

O Facebook, na sua constante amabilidade de promoção altruísta da amizade pelo planeta, sugere-nos simpaticamente no seu quadro direito os amigos que ele pensa que nos faria bem ter na nossa "rede". Nas últimas semanas, ele insiste que eu me faça amigo de alguém que na verdade... já morreu! Todos os dias me pergunto se devo ser amigo de um morto.

A morbidez da sugestão não me impede de olhar com carinho ao memorial que existe naquela página. É possível que seja também uma homenagem... um cemitério virtual.

No Secúlo XXI... prepara-se a morte em toda a sua amplitude, o fim do corpo e o nosso fim virtual.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

TimeOut


É uma cidade pequena. É uma cidade fechada. É uma cidade cinzenta. É também a minha cidade. O que não quer dizer que não venha a ter outras. Existem sempre outras... Mas este será um daqueles casos que o primeiro amor ficará para toda a vida. 

Foi um verdadeiro flashback saudoso percorrer as 101 actividades propostas pela TimeOut Porto nº1 para fazer na Mui Nobre e Sempre Leal Invicta. Na verdade, entre esta centena de coisas estimulantes, relaxantes, interessantes ou simplesmente curiosas, estão algumas recentes inovações trendy, ou da moda, de gosto dúbio e que certamente não constarão de hipotética igual lista a ser lançada no nº100. Mas em todo o caso o meu Porto está ali. Não é só aquele, há muito mais que ali não está. Mas em cada passo, a cada proposta, eu reencontrei-me ali, naquele local num qualquer momento pretérito do tempo.

Não vou esconder o meu provincianismo ao regozijar com a criação da TimeOut Porto. Só posso entender que se foi criada é porque a cidade atingiu uma maturidade cultural que lhe permite alimentar mensalmente aquelas páginas. Passa agora a figurar ao lado de centenas de cidades de reconhecida valência cultural e que por isso justificam a criação de uma magazine, um guia, um compêndio de tudo aquilo que um punhado de iluminados do momento mais os apoios publicitários colocam a chancela de: relevante!
Por outro lado, e a julgar por algumas recentes inovações no mercado das publicações em Portugal (ver a fraca qualidade da Playboy Portugal) já compreendi que há iniciativas que se revelam ser menos pensadas e programadas do que inicialmente seria de esperar e o resultado é bastante desapontador. Por tudo isto, convém controlar as expectativas já que não sei quanto tempo vai durar e que conteúdos vai poder continuar a apresentar. Temo até que, dentro de um ano ou assim... o flare inicial se tenha desvanecido e simplesmente se coloque em stand-by o projecto.

Mas o meu provincianismos bacoco é mais profundo. Talvez inclusive se revista de um certo egoísmo conservador. Eu não gosto de ver as minhas memórias, a minha cidade, a minha vida... num guia! É uma violência olhar para as experiências que vivi e imaginar alguém com uma revista na mão entrar pela porta a dentro à espera de encontrar os tais cachorros que eu só descobri passados muitos anos que existiam numa porta pequena, algumas ruas ao lado da minha faculdade, ou saírem da discoteca de máquina na mão para fotografar aquele nascer-do-sol do miradouro às 0730 da manhã porque a revista diz que é fenomenal! Foram tudo pequenos segredos e surpresas que me levaram anos descobrir, com os quais cresci, alguns fruto do acaso, outros partilhados no falso segredo da amizade. É por eu possuir aquele conhecimento que as pessoas sabem também que aquela é a minha cidade.

Aquele guia... banaliza-me e mercantiliza-A. Alguém pegou num património cultural comum... e colocou-o ali à venda. Da próxima vez que alguém visitar a Invicta e me perguntar por dicas... posso simplesmente dizer: vai ver a revista!

Estou provavelmente a exagerar e a mentir. Na verdade... o que eu diria seria: bai ber a rebista! ...e isto, acho que nem a TimeOut consegue por alguém naturalmente a dizer!

terça-feira, 4 de maio de 2010

Saldos

Se as mulheres não existissem, todo o dinheiro do mundo deixaria de ter significado...
Aristóteles Onassis


*Ainda sobre o Dubai

sábado, 1 de maio de 2010

Artificial

ar.ti.fi.ci.al - comum de dois géneros

1. Feito por arte ou indústria;

2. Que não é natural;

3. Dissimulado; fingido; postiço;

Assim é o Dubai. Artificial. Mais pelos dois primeiros que do último. Não encontro muita dissimulação. Tudo que é copiado, é assumidamente assim. Talvez postiço seja o enquadramento islâmico, pelo desvirtuar da génese cultural arábica... resultado de uma intensa pressão demográfica externa trazida pela evolução civilizacional empurrada à força do dinheiro do petróleo. No entanto a artificialidade é total. Nada é natural. Não houve aqui uma evolução espontânea normal. Nem a pouca vegetação existente foi per si gerada. Tudo foi trazido de fora e feito sobre as areias vazias do deserto. Se esquecermos a oração que se faz soar nos corredores do shopping, e um ou outro constrangimento que resiste ainda do legado árabe, o Dubai é com certeza um dos locais mais multiculturais do planeta. 90% da população é estranha a este lugar, aqui reside sem lhe chamar casa. Vem de toda a parte do mundo, será por ventura o mais semelhante que possuimos neste momento a uma estação Lunar na Terra. Pelo menos aridez vazia é o que não falta à volta. Não é a artificialidade que me incomoda.

Depois existe a oferta. O consumo bate-se subrepticiamente pelo lugar de religião predominante. Mas se o consumo é associado a bens materiais, todos os que existem à face do planeta e em particular os mais luxuosos, por outro lado também é composto pela oferta cultural. Não é certamente Berlim, ou NYC, ou Londres, ou Paris, mas o que de melhor se faz musicalmente e de exposições passa de tempos a tempos por aqui. Não se sobrevive mentalmente... até aí vive-se com luxo.

A constatação mais marcante é a de que todos os que vieram, somados aos poucos que cá estavam, vieram sobretudo pelo dinheiro. O que move aqui as pessoas é a ganancia e ambição. Como uma versão moderna de uma cidade do ouro no oeste americano, desta feita sobre a capa da sofisticação da knowledge economy e dos serviços de topo. Todos passam por aqui para ganhar o seu quinhão. Outros vêm simplesmente na expectativa de encontrar naquele restaurante ou naquela reunião o furo das suas vidas. Passeio-me entre eles e ouço as suas conversas. Não lhes reconheço uma ambição ou ganancia desmesuradas. Se há algo que posso distinguir é a cosmopolitismo e a diversidade que enriquecem o ambiente. O problema é o resultado do somatório destas vontades, destas predisposições mentais... um individualismo hedonista que, como um estupefaciente incolor e inodoro, inquina as águas dessalinadas roubadas ao mar que sustentam esta babilónia e todos intoxica. Não há um fito comum à comunidade... todos apenas estão aqui para e por si, e desejam invariavelmente partir.

Uma terra de passagem, de crescimento, artificial, e de sustentabilidade precária. E no entanto... extremamente divertida!


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